domingo, 4 de abril de 2010

Úmido total

Morro do Canal II

A água é gelada por ali. A represa do Carvalho, antiga captação de água dos mananciais de Piraquara para abastecer a região metropolitana de Curitiba. A placa na entrada indica a data de 1905. Hoje, o antigo sistema de piscinas não é mais usado. É um, digamos, ponto turístico próximo a serra. Eu e o Guia, a Mulher de botas e o Segurança fomos de carro até o reservatório principal. De lá para dentro a viagem continuou a pé.

Alguns registros foram feitos da bela paisagem. Eu esqueci minha parte do equipamento no carro. Já estávamos caminhando a algum tempo e tive de voltar sozinho, por um longo trecho para buscá-los. A roda preta e a erva.

A caminhada até o carro foi tranquila. Minha mente me dominou, o medo paranóico dominou o ritmo da minha caminhada. Na volta, a trilha de cascalho já era mais conhecida, as curvas no meio do matagal já eram verossímeis.

Várias libélolas, borboletas e beija-flores. A água é gelada por ali e entramos numa das piscinas até a altura da cintura. Comemos sanduíches de queijo e bebemos água da nascente. Comemos maças geladas na água da nascente. O céu oscilava. Fechado. Aberto. Fechado. Ensolarado.

O tédio começou a nos tomar e vimos a noite quase nos apanhar ainda na trilha. Voltamos a caverna . O tabaco e o álcool acabaram e subimos alguns quilometros, eu e o Segurança, com cascos das garrafas, jaquetas impermeáveis e guarda-chuvas até a venda do Zezinho. As poucas moedas nos renderam quatro cervejas e a chuva na escuridão nos fez ir mais devagar. Cair nas pedras pode ser fato, depende do equilíbrio do indivíduo.

Pela metade do caminho, quando a vigilância na estrada nos abandonou (porque o ser humano é assim, a rotina e a distração as vezes nos coloca em perigo) uma movimentação me tomou de assalto. Pensei ser um sapo, se mechendo naquele trecho do caminho, negramente chuvoso. Quando me vi de volta a si, novamente em estado de alerta (porque o ser humano é assim, sempre assombrado por seu instinto de sobrevivência) vi que era algo mais rasteiro, seu corpo todo em contato com o solo barrrento. “Uma cobra!” gritei para o Segurança. Ele pulou e disse “mentira”. Eu disse “não é mentira, veja, ela está entrando no mato, ali no barranco”. Mas ela já tinha se embrenhado na vegetação. Pensei comigo “filha-da-puta, cobra do caralho. Isso, suma, assim nunca acreditarão em mim”. O Segurança, diante da cena me chamou de “alarmista de merda”. “Desnecessário”, disse ele, “Desnecessário completamente”.

Assustado e com ar de mentiroso terminei a caminhada. Um banho de água fria, acorda, esperta para a realidade. Nem que seja um banho de água fria na credibilidade do seu discurso.

* * * * * *

"Mentira la mentira
Mentira la verdad

Todo es mentira en este mundo
Todo es mentira la verdad
Todo es mentira yo me digo
Todo es mentira ¿Por qué será?" - Manu Chao

Um comentário:

Carol rehbein disse...

com medinho de cobra amor??!!!