segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Insônia Crônica - Parte II

Mil mentiras e um bom disfarce.


MM Productions


Nem todos querem sair deste mundo confortável, debaixo de nossas cobertas, nós gostamos deste tempo de alienação, tanto que nos submetemos a ele, mesmo sabendo que o despertar será quase insuportável cada dia de sua vida. Mas ainda assim ele é preferível e sem ele alguns poucos vivem neste planeta.

Não me sinto feliz ter esta característica, para a maioria é loucura e ceticamente descartam esta possibilidade como verdadeira. Alguns poucos reconhecem como algo importante, que trará alguma resposta, pequenas luzes num universo escuro, talvez esta seja a verdade. Estas questões não importam quando se sofre tanto por receber esta situação de bom grado. Sofrer para receber algo maior em seu tempo de reflexão.

Eu vivo uma vida simples, faculdade pela manhã, almoço em algum restaurante barato do centro da cidade, a tarde trabalho, geralmente mais do que deveria e mais do que eu recebo pra fazer, a noite vou pra casa, leio por 4 horas, assisto um pouco de TV e deito no sofá. Permaneço com a luz acesa mais algumas horas e as apago. Ali fico olhando para a tela da TV, em canais onde se tem a maior concentração de “chuviscos”. As cinco da manhã levanto, tomo um banho quente, me visto, fumo um cigarro e vou pra faculdade. E daí mais um dia se passa, continuamente, dentre tantos outros que vi nascer é morrem dentro de um conjunto de horas.

Percebe como as coisas são tão passageiras? Se acabam de maneiras inesperadas e passam, aos poucos esquecidas encobertas pelas folhas arrancadas do calendário da porta da sala. Um desenho infantil sobre ele mostra que por mais que ele possa me vencer impondo seu tempo, criado, que me mata envelhecendo, ainda persiste acima dele um espírito infantil, curioso, questionador e acima de tudo pouco feliz com o que vê.

Aquela vez que eu abandonei a casa me disseram que nunca mais deveria voltar. Jogaram todas as minhas coisas numa caixa, em meus braços largaram e pra fora fui chutado. Neste dia pouco, ou quase nada me importei, afinal, em parte era o que eu queria. Infelizmente, pouco tempo depois percebi que muito havia perdido e que por isso pagaria o resto de meus dias. Assim com medo de que eles demorassem a passar por serem muitos, resolvi torná-los todos em apenas um. Um interminável dia, mesclado aleatoriamente num caos contido entre o claro e o escuro.

Acordar é sempre traumático. Por isso eu nunca durmo. Minha visão daqui é bem mais clara do que antes, sei bem como tudo vai acabar, só não sei quando. Mas no fundo, no fundo, agente sabe que a questão é a possibilidade, nunca o que “é”, mas sempre o que “pode ser”.


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Mais aliviado agora que passou.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Insônia Crônica - Parte I

Uma confissão difícil.

Charles Gullung


Acordar sempre é difícil, olhar que um dia claro ou nublado já está lá fora e nem te esperou, ainda é realmente traumático. Deve ser por isso que muitas pessoas sofrem tanto, suas vidas são cheias de rupturas as quais nem sempre se está preparado. Ai você sofre. Mas logo passa, nos últimos tempos mais do que nunca as coisas tendem a ser efêmeras. Enjoam fácil, repete-se demais. No fim você não agüenta nem o cheiro quanto mais o gosto.

Por isso acho que nada melhor que um sono tranqüilo e um despertar traumático, cheio de insegurança e doloroso, prefiro uma constante seção acordado ou em coma. Acordado durante o dia e enquanto ainda consigo fazer certas atividades, seja trabalhando, estudando ou simplesmente saindo com os amigos. Em coma, por que o sono, quando assume um tom leve e semi acordado, não é um sono, é um estado de meio termo, entre o desligado e o ligado, entre o ‘on’ e o ‘off’.

Já ouvi quem diagnosticasse como uma insônia crônica, e quem afirma-se ser um distúrbio grave de comportamento, tantos outros que questionaram ser uma praga de família, bem todos eles tentaram, palpitaram, jogaram as cartas, mas ninguém levou as fichas.

Não posso dizer e classificar esta situação como um transe, acho que não se encaixa. Mas também não afirmo que seja um estado de plenitude de realidade, realmente algumas coisas são bem surreais, ou mesmo absurdas. A primeira mutação visível é a dificuldade de enxergar com clareza. Você percebe as coisas, os espaços, até mesmo letras em uma leitura dinâmica. O que acontece é que uma série de imagens, vultos, e objetos não bem focados dificultam uma visão mais objetiva.

A audição permanece aguda, mas nada que impeça a captação de duas, três, quatro ou até mais fontes diferentes com clareza e simultaneamente. Ou seja, cada canal é armazenado e pode ser acessado segundo minha vontade tempos depois para complementar uma idéia ou situação já pré-formulada vinda de outro canal. É um processo natural, nunca forçado.

Sendo estes dois elemento primordiais para a minha percepção do mundo externo modificados e postos em um ‘limbo’ entre o real e o virtual, acredito que neste momento me situo na porta que divide estes dois espaços. Sendo assim, nunca durmo. Reponho minhas energias através deste tempo potencializado, que tem como critério basilar o que pode ser, nunca o que simplesmente é. Não é uma questão de existir ou não, a questão é quando vai existir. Potenciais.

Por isso passo a vida de uma maneira diferente das outras pessoas. Enquanto a maioria delas descreveria um dia de no máximo 18 horas, um cotidiano intervalado por um período de recuperação, que se torna inútil com a transcendência. Nela, a meditação, a reflexão, entre os pólos existentes nos torna eternos peregrinos em busca de uma resposta, que nem sempre é fácil de aceitar.


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continua no próximo post...

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Noites e dias em vão

O que nos faz mal, mas sempre queremos um pouco mais. Passa e você nem vê, nem sente.



Dave Cutler


Três dias num só.

Amanhece e anoitece, tudo continua ali, acordado.

Os olhos não cerram uma única vez.

Uma constante sensação que se modifica aos poucos.

Numa infinita metamorfose no mundo onde ninguém dorme.

Duas madrugadas na loucura.

Perdido em sua própria casa. Tantas pessoas nunca antes vistas. Estranho.

 

Todos dormem em qualquer lugar.

Com seus corpos retorcidos, cheios de sentimentos mentirosos.

Um prazer inexistente, sem começo nem fim.

Uma possibilidade abstrata. Mentirosa.

 

Acordar depois dos três dias de insônia é difícil.

Tudo num raio de 100 mil quilômetros parece sujo, fora do lugar, macabro.

 

Tudo recomeça.

Agora sobriamente chato.

Daqui a uma semana mergulho de novo na macabra procissão de loucura.

 

Tempo em vão.

Noites e dias em vão.

O prazer é mentiroso.

Não é como parece.

Passa e você nem vê.

Nem sente.

E ainda fica querendo mais.

 

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eu quero sempre mais... eu quero sempre mais...